NEGÓCIOS DA ELITE
Texto não editado publicado na edição de 24 de Novembro de 2007 da revista Notícias Sábado
A ideia romântica, talvez cinéfila, de que um advogado todo-poderoso apenas colecciona prestígio e cifrões na conta bancária à medida que usa sibilinos argumentos para vencer processos na barra do tribunal, está já muito longe da realidade. Pode ser assim em alguns, poucos casos, mas será agora uma excepção. Para muitos advogados, as togas são agora um adereço do passado, guardado nos baús, a ganhar traça ou a cheirar naftalina. Na verdade, no mundo mais rentável da advocacia quase não se tem de cruzar os olhos com um juiz, veste-se sobretudo fato e gravata, ou então tailleur – porque, como em todos os sectores, as mulheres começam a dominar neste sector, que há décadas era quase exclusivamente masculino. E a argumentação jurídica faz-se à volta de computadores ligados a bases de dados jurídicas e de jurisprudência e em redor de mesas de reuniões, onde se fazem negócios, se elaboram pareceres e se representam empresários em chorudas transacções.
A ideia romântica, talvez cinéfila, de que um advogado todo-poderoso apenas colecciona prestígio e cifrões na conta bancária à medida que usa sibilinos argumentos para vencer processos na barra do tribunal, está já muito longe da realidade. Pode ser assim em alguns, poucos casos, mas será agora uma excepção. Para muitos advogados, as togas são agora um adereço do passado, guardado nos baús, a ganhar traça ou a cheirar naftalina. Na verdade, no mundo mais rentável da advocacia quase não se tem de cruzar os olhos com um juiz, veste-se sobretudo fato e gravata, ou então tailleur – porque, como em todos os sectores, as mulheres começam a dominar neste sector, que há décadas era quase exclusivamente masculino. E a argumentação jurídica faz-se à volta de computadores ligados a bases de dados jurídicas e de jurisprudência e em redor de mesas de reuniões, onde se fazem negócios, se elaboram pareceres e se representam empresários em chorudas transacções.
Num mercado global, em que o capital fala mais alto, o direito societário, e as suas inúmeras ramificações, tornou-se já principal ganha-pão da esmagadora maioria dos advogados. E sobretudo das sociedades de advogados que, actualmente, atingem as 744, embora cerca de dois terços sejam de pequena e média dimensão – ou seja, com até cinco sócios. «Dado a maior complexidade e inter-relação legislativa, as sociedades têm assim a vantagem de poder chegar a mais áreas e satisfazer todas as necessidades dos grandes clientes», salienta Duarte de Athayde, presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal (ASAP) e um dos sócios da Abreu Advogados, a quarta maior do país em número de juristas.
Por isso, os advogados de maior sucesso acabam por ser os especialistas num determinado sector. Já não há muito espaço para os generalistas que sabem de tudo um pouco, pois não é suficiente em processos onde se precisa mais dos poucos que sabem muito. O resto é integração e trabalho de equipa, dentro da mesma sociedade.
Actualmente, se é certo que quase todas as grandes sociedades de advogados não prescindem de manter as suas equipas para tratar questões menos rentáveis e mais «corriqueiras» – leia-se, por exemplo, crimes contra as pessoas e património –, as baterias são apontadas sobretudo para as áreas jurídicas que envolvem contratos empresariais, fusões, aquisições, privatizações e imobiliário, já que estes negócios nunca se fazem sem um batalhão de advogados especialistas na vanguarda e retaguarda. Por vezes, várias dezenas. «Por exemplo, uma OPA é uma operação muito complexa, uma vez que tem que se ter em conta legislação de mercado de capitais, de reestruturações, de regulação e concorrência, de relações com o mercado mobiliário, etc.», destaca Duarte de Athayde. Se bem que alguns processos sejam mediáticos – como foram os casos recentes das OPA do BCP sobre o BPI e da Sonae sobre a PT –, estão longe de serem raros num mercado novamente em ebulição. «O trabalho nestas áreas acompanha os ciclos económicos; quando existe um bom momento é quando se fazem as operações de aquisições e de fusões», refere José Miguel Júdice, um dos sócios da PLMJ, a maior das sociedades de advogados do país.
Actualmente, se é certo que quase todas as grandes sociedades de advogados não prescindem de manter as suas equipas para tratar questões menos rentáveis e mais «corriqueiras» – leia-se, por exemplo, crimes contra as pessoas e património –, as baterias são apontadas sobretudo para as áreas jurídicas que envolvem contratos empresariais, fusões, aquisições, privatizações e imobiliário, já que estes negócios nunca se fazem sem um batalhão de advogados especialistas na vanguarda e retaguarda. Por vezes, várias dezenas. «Por exemplo, uma OPA é uma operação muito complexa, uma vez que tem que se ter em conta legislação de mercado de capitais, de reestruturações, de regulação e concorrência, de relações com o mercado mobiliário, etc.», destaca Duarte de Athayde. Se bem que alguns processos sejam mediáticos – como foram os casos recentes das OPA do BCP sobre o BPI e da Sonae sobre a PT –, estão longe de serem raros num mercado novamente em ebulição. «O trabalho nestas áreas acompanha os ciclos económicos; quando existe um bom momento é quando se fazem as operações de aquisições e de fusões», refere José Miguel Júdice, um dos sócios da PLMJ, a maior das sociedades de advogados do país.
Embora confirme que o direito societário seja a fonte maioritária das receitas da PLMJ, este ex-bastonário da Ordem dos Advogados diz que outras áreas começam a ter um peso significativo, designadamente o contencioso fiscal e tributário. Sintoma da luta contra a fraude fiscal encetada pelo Estado nos últimos anos – que quase sempre, sobretudo em montantes elevados, acabam nos tribunais tributários, e, portanto, necessitam dos auspícios de bons advogados.
Evitar que os clientes acabem a dirimir as questiúnculas nos habituais tribunais é também um dos «mercados» mais atractivos e lucrativos destas sociedades ou de juristas reconhecidos. «Por um exemplo, um processo de falência pode levar mais de uma década a estar concluído», salienta Menezes Cordeiro, professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa e um dos mais reconhecidos jurisconsultos portugueses, daí que «os centros de arbitragem sejam uma solução». Estes centros – que existem para as pequenas e grandes questões, embora geralmente em separado – recorrem a dois peritos, um por cada uma das partes, que nomeiam um terceiro elemento que preside. «Por norma têm um prazo de resolução de seis meses, em questões que poderiam levar anos num tribunal comum», refere Menezes Cordeiro, que é um dos vogais do Conselho do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), que patrocina e medeia este tipo de processos. «As partes em conflito conseguem assim resolver mais rapidamente os problemas porque o prazo é, por regra, de seis meses, além de que evitam que seja um juiz a tratar de questões que, por vezes, são de elevadíssima complexidade», afirma Menezes Cordeiro.
Evitar que os clientes acabem a dirimir as questiúnculas nos habituais tribunais é também um dos «mercados» mais atractivos e lucrativos destas sociedades ou de juristas reconhecidos. «Por um exemplo, um processo de falência pode levar mais de uma década a estar concluído», salienta Menezes Cordeiro, professor catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa e um dos mais reconhecidos jurisconsultos portugueses, daí que «os centros de arbitragem sejam uma solução». Estes centros – que existem para as pequenas e grandes questões, embora geralmente em separado – recorrem a dois peritos, um por cada uma das partes, que nomeiam um terceiro elemento que preside. «Por norma têm um prazo de resolução de seis meses, em questões que poderiam levar anos num tribunal comum», refere Menezes Cordeiro, que é um dos vogais do Conselho do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), que patrocina e medeia este tipo de processos. «As partes em conflito conseguem assim resolver mais rapidamente os problemas porque o prazo é, por regra, de seis meses, além de que evitam que seja um juiz a tratar de questões que, por vezes, são de elevadíssima complexidade», afirma Menezes Cordeiro.
Mas embora até possa ser mais barato para as partes conflituantes do que os tribunais, os árbitros podem facturar boas maquias em pouco tempo. Por exemplo, uma causa que tenha um valor de cinco milhões de euros pode implicar o recebimento, por parte dos árbitros de cada uma das partes e do presidente, de até cerca de 45 mil euros. Em contratos internacionais, em que os litígios são moderados pela Câmara Internacional de Comércio, sediada em Paris, os honorários podem ser muito superiores. «Muitas empresas, sobretudo em contratos que envolvem países diferentes, colocam cláusulas no sentido de os litígios serem resolvidos por uma comissão arbitral, de modo a que nenhuma esteja sujeita aos tribunais de outro país», refere José Miguel Júdice, que este ano já foi nomeado para quatro destas comissões internacionais de arbitragem.
Porém, esta tarefa não é para todos, o que até tem lógica e justificação, porque não «é» quem quer, mas sim quem pode. Ou seja, só há espaço para quem tem conhecimentos – sem aspas, saliente-se. Por exemplo, na lista de árbitros do Centro de Arbitragem da CCIP constam apenas pesos-pesados do direito, como Lobo Xavier, Menezes Cordeiro, Carlos Osório de Castro, Proença de Carvalho, Germano Marques da Silva, Medina Carreira, Sérvulo Correia, Vera Jardim, Sáraaga Leal, Marcelo Rebelo de Sousa, Rui Machete, Rui Pena, Vasco Vieira da Silva, bem como os antigos bastonários António Osório de Castro, Pires de Lima, José Miguel Júdice, Castro Caldas, Maria de Jesus Serra Lopes e Mário Raposo. Praticamente todos são sócios das principais sociedades de advogados portuguesas.
Na mesma linha, os pareceres são outra «indústria» promissora no direito, que «obriga» que qualquer grande sociedade de advogados necessite de nomes sonantes para os fazerem em questões mais complexas. Porém, neste caso, muitos jurisconsultos trabalham nesta área em escritórios de pequena ou média dimensão, ou mesmo a título individual. Mas, neste caso, vale sobretudo o grau académico do autor, que para ter um peso significativo deverá ser professor catedrático, sendo conveniente ter escrito também vários livros de direito. Por isso, embora pareceres haja muitos, os mais conceituados na praça portuguesas são, por regra, os de Costa Andrade, Gomes Canotilho, Marcelo Rebelo de Sousa, Vital Moreira e Menezes Cordeiro.
Porém, esta tarefa não é para todos, o que até tem lógica e justificação, porque não «é» quem quer, mas sim quem pode. Ou seja, só há espaço para quem tem conhecimentos – sem aspas, saliente-se. Por exemplo, na lista de árbitros do Centro de Arbitragem da CCIP constam apenas pesos-pesados do direito, como Lobo Xavier, Menezes Cordeiro, Carlos Osório de Castro, Proença de Carvalho, Germano Marques da Silva, Medina Carreira, Sérvulo Correia, Vera Jardim, Sáraaga Leal, Marcelo Rebelo de Sousa, Rui Machete, Rui Pena, Vasco Vieira da Silva, bem como os antigos bastonários António Osório de Castro, Pires de Lima, José Miguel Júdice, Castro Caldas, Maria de Jesus Serra Lopes e Mário Raposo. Praticamente todos são sócios das principais sociedades de advogados portuguesas.
Na mesma linha, os pareceres são outra «indústria» promissora no direito, que «obriga» que qualquer grande sociedade de advogados necessite de nomes sonantes para os fazerem em questões mais complexas. Porém, neste caso, muitos jurisconsultos trabalham nesta área em escritórios de pequena ou média dimensão, ou mesmo a título individual. Mas, neste caso, vale sobretudo o grau académico do autor, que para ter um peso significativo deverá ser professor catedrático, sendo conveniente ter escrito também vários livros de direito. Por isso, embora pareceres haja muitos, os mais conceituados na praça portuguesas são, por regra, os de Costa Andrade, Gomes Canotilho, Marcelo Rebelo de Sousa, Vital Moreira e Menezes Cordeiro.
A elaboração de um parecer pode, em casos especiais, atingir montantes elevados, até 40 mil euros – mas há quem, em casos especiais, os possa até fazer graciosamente –, mas tudo depende daquilo que o cliente pretende, bem como da consciência do jurisconsulto. Até porque é sabido que, mesmo existindo pareceres contraditórios de doutos jurisconsultos, ninguém faz pareceres como «advogado do Diabo» – isto é, defendendo teses jurídicas sobre aquilo que não acredita, apenas para receber os honorários. Mas estes valores elevados por um parecer valem bem o seu preço, porque os juízes não podem omitir esses argumentos, sob risco do acórdão poder mesmo vir a ser considerado nulo.
Mas para singrar na advocacia não basta saber: é também, e muito, necessário ter contactos privilegiados para cativar clientes. E se no caso das empresas privados a escolha tem critérios preferencialmente de qualidade – mesmo se a publicidade directa é proibida pelo código deontológico e não existem estatísticas sobre processos ganhos e perdidos pelos escritórios de advogados –, já o mesmo não acontece com o cliente mais apetecível e com maiores orçamentos. Ou seja, o Estado! Há cerca de dois anos, José Miguel Júdice causou polémica por ter recomendado que o Estado deveria consultar as três maiores sociedades de advogados – incluindo, portanto, a «sua» PLMJ – quando necessitasse de trabalhos jurídicos, tendo mesmo sido alvo de um inédito processo na Ordem dos Advogados. Júdice diz, porém, que a sua intenção não era que fossem entregues, mas sim que as maiores sociedades não fossem arredadas, como é hábito. «Não existe transparência na contratação de trabalhos de advocacia para o Estado; são entregues não se sabe bem como nem com garantias de melhor preço e de melhor qualidade», lamenta o antigo bastonário. Pela mesma bitola vai também Duarte de Athayde e Menezes Cordeiro que defendem a existência de concursos para estes casos.
Mas para singrar na advocacia não basta saber: é também, e muito, necessário ter contactos privilegiados para cativar clientes. E se no caso das empresas privados a escolha tem critérios preferencialmente de qualidade – mesmo se a publicidade directa é proibida pelo código deontológico e não existem estatísticas sobre processos ganhos e perdidos pelos escritórios de advogados –, já o mesmo não acontece com o cliente mais apetecível e com maiores orçamentos. Ou seja, o Estado! Há cerca de dois anos, José Miguel Júdice causou polémica por ter recomendado que o Estado deveria consultar as três maiores sociedades de advogados – incluindo, portanto, a «sua» PLMJ – quando necessitasse de trabalhos jurídicos, tendo mesmo sido alvo de um inédito processo na Ordem dos Advogados. Júdice diz, porém, que a sua intenção não era que fossem entregues, mas sim que as maiores sociedades não fossem arredadas, como é hábito. «Não existe transparência na contratação de trabalhos de advocacia para o Estado; são entregues não se sabe bem como nem com garantias de melhor preço e de melhor qualidade», lamenta o antigo bastonário. Pela mesma bitola vai também Duarte de Athayde e Menezes Cordeiro que defendem a existência de concursos para estes casos.
Certo é que, apesar desta situação, política e advocacia andam de mãos dadas nos corredores do poder, com advogados saltitando de um lado para o outro da «barricada», ou tendo mesmo a benesse da ubiquidade. E não há muito interesse em mudar. Por exemplo, actualmente, existem quase 80 licenciados em direitos que são deputados e muitos exercem advocacia. A Ordem dos Advogados até pretende que haja incompatibilidades entre advocacia e corredores de São Bento, mas como se exige uma mudança legislativa, nada é alterado. Em todo o caso, também nenhuma das grandes sociedades de advogados desdenha em ter ex-governantes como sócios ou colaboradores, mesmo se como advogados as suas prestações anteriores sejam medianas. Ou então apostam na contratação de figuras que estejam em ascensão no panorama partidário, mesmo que estejam conjunturalmente na oposição.
Nesse aspecto, também aqui houve uma mudança radical no mundo da advocacia ao longo das três décadas de democracia. Muitos dos políticos do período imediatamente posterior ao 25 de Abril começaram na advocacia, dando cartas, e pela sua experiência acabaram «recrutados» para a política – e muitos regressaram depois à advocacia. Mas agora existem muitos advogados que necessitam do trampolim político para conseguirem, enfim, singrar na advocacia. Os tempos estão difíceis para todos.
Caso 1
Nos últimos dois anos, a Autoridade da Concorrência pronunciou-se, em extensos relatórios, sobre cerca de 150 processos de fusão e aquisição. Todos grandes negócios, mas que nem sempre chegaram a bom porto. Dois desses foram dos mais mediáticos de sempre: a OPA da Sonae sobre a PT e a do BCP sobre o BPI, cujos anúncios surgiram no primeiro trimestre do ano passado. A intensa guerra que se sucedeu ao longo de inúmeros meses, até ao fracasso de ambas, teve vários protagonistas, mas na «sombra» trabalharam as melhores sociedades de advogados. Uma delas – a Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados –, acabou, porém, de sair sempre derrotada. Apesar de contar com advogados prestigiados como João Soares da Silva (no apoio ao BCP), de Lobo Xavier e Carlos Osório de Castro (no apoio à Sonae), as duas OPA saíram abortadas. As estratégias do outro lado da barricada para o aconselhamento jurídico foram bem distintas. Enquanto o BPI praticamente fez a defesa com a prata da casa, a PT não se poupou: contratou as portuguesas Vieira de Almeida & Associados, a PLMJ e a Gonçalves Pereira, Castelo Branco & Associados, além da espanhola Garrigues e da norte-americana Simpson & Bartlett.
Para se ter uma ideia da complexidade desta operação, que teve muito de jurídico, basta dizer que as versões não confidenciais dos relatórios da Autoridade da Concorrência tinham 849 e 672 páginas, respectivamente para as OPA sobre a PT e sobre o BPI...
Caso 2
O caso Eurominas – uma antiga unidade de produção de ligas de manganés no Seixal – ficará, porventura, nos anais como o mais «brilhante» trabalho dos advogados em prol do seu cliente... mas em prejuízo do erário público. E também o paradigma da promiscuidade entre política e advocacia, bem como dos perigos dos acordos extrajudiciais em que o Estado é uma das partes.
Depois do então primeiro-ministro Cavaco Silva, em 1995, ter decretado a reversão dos terrenos para o Estado por entretanto a empresa ter deixado de pagar à EDP e estar então, desde 1986, com laboração suspensa, a empresa teve melhor sorte para satisfazer um pedido de indemnização com o Governo socialista. Até aí os tribunais não estavam a ser meigos para as pretensões daquela empresa de capitais sul-africanos e franceses, mas mesmo assim a Eurominas conseguiu entrar em negociações com o gabinete do então ministro António Vitorino. Este governante entretanto demitiu-se em Novembro de 1997, sendo seguido pelos seus colegas José Lamego e Alberto Costa. Mas os três socialistas não perderam o olho no negócio, pois a partir daí passaram a interceder ao serviço da Eurominas. E assim, mesmo se numa primeira fase a Administração do Porto de Setúbal recomendou que o caso fosse resolvido nos tribunais – que quase garantidamente não daria razão à empresa –, o Estado, através do Governo socialista, concedeu um montante de 12 milhões de euros. Perante o escândalo, ainda se abriu um inquérito parlamentar, mas deu em «águas de bacalhau».
Caso 3
Por todo o Mundo, sucedem-se as guerras comerciais e uma marca chega a ser mais protegida do que uma pessoa, mesmo a nível internacional. Uma história saborosa, onde os advogados tomam uma posição preponderante, passou-se entre Joe Berardo e a poderosíssima Philips Morris. E que também mostra a lentidão de um processo judicial, o que mostra as conveniências de alguns acordos extrajudiciais – para o bem e para o mal.
Em 1996, o empresário madeirense – que possui uma vivenda denominada Mar Belo – decidiu começar a fabricar cigarros e tentou inscrever no Instituto Nacional da Propriedade Industrial, mas esta entidade recusou, alegando que se confundia com a marca Marlboro e que o grafismo e cores da Marbelo eram semelhantes à dos cigarros da empresa norte-americana. Nas duas primeiras instâncias, Joe Berardo perderia, mas depois de mais uns quantos pareceres, o Supremo Tribunal de Justiça dar-lhe-ia razão em Maio de 2003. Joe Berardo começaria a comercializar essa marca na Madeira e Continente a partir desse ano – embora sem grande sucesso – e anunciou um pedido de indemnização nos tribunais norte-americanos devido aos prejuízos causados pelos anos em que esteve impedido de fazer vendas. Ou seja, mais trabalho para advogados.
Caso 1
Nos últimos dois anos, a Autoridade da Concorrência pronunciou-se, em extensos relatórios, sobre cerca de 150 processos de fusão e aquisição. Todos grandes negócios, mas que nem sempre chegaram a bom porto. Dois desses foram dos mais mediáticos de sempre: a OPA da Sonae sobre a PT e a do BCP sobre o BPI, cujos anúncios surgiram no primeiro trimestre do ano passado. A intensa guerra que se sucedeu ao longo de inúmeros meses, até ao fracasso de ambas, teve vários protagonistas, mas na «sombra» trabalharam as melhores sociedades de advogados. Uma delas – a Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados –, acabou, porém, de sair sempre derrotada. Apesar de contar com advogados prestigiados como João Soares da Silva (no apoio ao BCP), de Lobo Xavier e Carlos Osório de Castro (no apoio à Sonae), as duas OPA saíram abortadas. As estratégias do outro lado da barricada para o aconselhamento jurídico foram bem distintas. Enquanto o BPI praticamente fez a defesa com a prata da casa, a PT não se poupou: contratou as portuguesas Vieira de Almeida & Associados, a PLMJ e a Gonçalves Pereira, Castelo Branco & Associados, além da espanhola Garrigues e da norte-americana Simpson & Bartlett.
Para se ter uma ideia da complexidade desta operação, que teve muito de jurídico, basta dizer que as versões não confidenciais dos relatórios da Autoridade da Concorrência tinham 849 e 672 páginas, respectivamente para as OPA sobre a PT e sobre o BPI...
Caso 2
O caso Eurominas – uma antiga unidade de produção de ligas de manganés no Seixal – ficará, porventura, nos anais como o mais «brilhante» trabalho dos advogados em prol do seu cliente... mas em prejuízo do erário público. E também o paradigma da promiscuidade entre política e advocacia, bem como dos perigos dos acordos extrajudiciais em que o Estado é uma das partes.
Depois do então primeiro-ministro Cavaco Silva, em 1995, ter decretado a reversão dos terrenos para o Estado por entretanto a empresa ter deixado de pagar à EDP e estar então, desde 1986, com laboração suspensa, a empresa teve melhor sorte para satisfazer um pedido de indemnização com o Governo socialista. Até aí os tribunais não estavam a ser meigos para as pretensões daquela empresa de capitais sul-africanos e franceses, mas mesmo assim a Eurominas conseguiu entrar em negociações com o gabinete do então ministro António Vitorino. Este governante entretanto demitiu-se em Novembro de 1997, sendo seguido pelos seus colegas José Lamego e Alberto Costa. Mas os três socialistas não perderam o olho no negócio, pois a partir daí passaram a interceder ao serviço da Eurominas. E assim, mesmo se numa primeira fase a Administração do Porto de Setúbal recomendou que o caso fosse resolvido nos tribunais – que quase garantidamente não daria razão à empresa –, o Estado, através do Governo socialista, concedeu um montante de 12 milhões de euros. Perante o escândalo, ainda se abriu um inquérito parlamentar, mas deu em «águas de bacalhau».
Caso 3
Por todo o Mundo, sucedem-se as guerras comerciais e uma marca chega a ser mais protegida do que uma pessoa, mesmo a nível internacional. Uma história saborosa, onde os advogados tomam uma posição preponderante, passou-se entre Joe Berardo e a poderosíssima Philips Morris. E que também mostra a lentidão de um processo judicial, o que mostra as conveniências de alguns acordos extrajudiciais – para o bem e para o mal.
Em 1996, o empresário madeirense – que possui uma vivenda denominada Mar Belo – decidiu começar a fabricar cigarros e tentou inscrever no Instituto Nacional da Propriedade Industrial, mas esta entidade recusou, alegando que se confundia com a marca Marlboro e que o grafismo e cores da Marbelo eram semelhantes à dos cigarros da empresa norte-americana. Nas duas primeiras instâncias, Joe Berardo perderia, mas depois de mais uns quantos pareceres, o Supremo Tribunal de Justiça dar-lhe-ia razão em Maio de 2003. Joe Berardo começaria a comercializar essa marca na Madeira e Continente a partir desse ano – embora sem grande sucesso – e anunciou um pedido de indemnização nos tribunais norte-americanos devido aos prejuízos causados pelos anos em que esteve impedido de fazer vendas. Ou seja, mais trabalho para advogados.